A difícil vida fácil

Por Ana Maria de Jesus

De acordo com o estudo da fundação francesa Scelles, que luta contra a exploração sexual, há, no mundo, mais de 40 milhões de pessoas que se prostituem. Desse total, cerca de 75% das mulheres têm entre 13 e 25 anos de idade. O estudo ainda relata que 90% das profissionais do sexo estão ligadas a cafetões.

A América Latina e os países ricos registram, respectivamente, 10% e 10,8%  do tráfico de pessoas para atividades ligadas ao sexo, segundo o  Relatório Mundial sobre Exportação Sexual – “A prostituição no coração do crime organizado”, publicado em um livro. Quase a metade das vítimas de redes de tráfico humano são crianças e jovens com menos de 18 anos.

Para a acompanhante *Sara, o principal motivo que atrai a maioria das profissionais do sexo está relacionado à questão do dinheiro. Ela relata que as meninas que conhece e que prestam serviços sexuais, moram com os pais, estudam e têm outro emprego como fachada para, digamos, justificar o dinheiro que recebem, já que a família não sabe que trabalham como acompanhantes.

O mercado da prostituição é grande, mas vale lembrar que só existe pela lei da “oferta e da procura”. E Sara revela: “A grande maioria de clientes são homens casados”. Segundo o relato, muitos nem vão atrás de sexo, mas de alguém para conversar. “Eu já fiz programas em que ficaram apenas em desabafos e beijos na boca”, revela.

Há quatro meses na profissão, Sara estuda Engenharia Civil e, segundo ela, as mensalidades atrasadas e o orçamento apertado foram fatores determinantes que a levaram para esse caminho. O primeiro contato foi por meio de uma amiga, que a convidou e apontou o bom retorno financeiro como ponto positivo.  “Posso dizer que, no meu caso, a questão financeira foi determinante. Hoje, eu ganho mais do que um engenheiro e esse dinheiro me possibilita ter a mensalidade da faculdade em dia, roupas de marca e joias, coisas que não conseguiria como assalariada”, explica.

*Fernanda e *Nicole, assim como Sara, também são acompanhantes destinadas às classes A e B. Fernanda está há um ano e diz que as meninas não podem ter essa profissão como a sua única fonte de renda. “Eu encaro a profissão de acompanhante como um freela, pois tenho outro emprego. O dinheiro que eu ganho aqui é uma poupança, porque eu não sei como será o futuro”, conta.

Nicole trabalha há apenas 40 dias e disse estar bastante satisfeita. Entrou na profissão por curiosidade e diz não ter vontade de sair. “A profissão de acompanhante está me proporcionando oportunidades que eu não teria acesso, além de tirar uma grana legal”, revela.  Ela diz que as mulheres não devem encarar a relação de seus maridos com as profissionais como traição, pois, na verdade, estão apenas contratando um serviço. “É como estar com vontade de comer chocolates, você vai até o mercado, compra e pronto. Sem contar que as prostitutas se cuidam muito mais para não pegar e não passar nenhuma doença transmissível”, minimiza a acompanhante. Na opinião de Nicole, as mulheres não correm qualquer risco de serem trocadas, como pode acontecer com as amantes.

“Nenhuma menina que trabalha na prostituição está aqui para encontrar o homem da sua vida. Todas sabem que isso é conto de fadas”, complementa.

Sara, Fernanda e Nicole dizem que, no local em que trabalham, têm total liberdade de recusar programas e que não são obrigadas a nada que não queiram, mas que isso raramente acontece. “Estou na profissão visando sempre à questão financeira, então não posso ficar analisando se a pessoa é alta, magra, gorda ou feia. Então, vejo as pessoas como clientes que possibilitarão retorno financeiro alto”, conta Sara.

Glamour

Não se pode ver a profissão como algo glamoroso. No caso de Sara, Fernanda e Nicole, que prestam serviços para clientes VIP’s, apesar de receberem convites para viagens e passeios de barco, com direito a compras, mesmo assim duas delas, a Sara e a Fernanda, pretendem fazer uma boa poupança e sair da profissão.

*Gabriela, que deixou o interior do Paraná, ainda menina, há três anos, não vê glamour nenhum, pelo contrário, sabe que todas as noites, quando vai para as ruas em busca de clientes, está exposta a todo tipo de violência.

Discriminação

Apesar de ser uma das mais antigas profissões do mundo, a discriminação da família e da sociedade é grande. A situação é muito mais complicada no caso dos travestis, gays e transexuais. A travesti *Michelle diz que, quando a família percebe que o rapaz não tem

“postura de homem”, o intima a deixar o ambiente familiar. “Muitos não querem cair na prostituição, mas, ao serem expulsos de casa, precisam encontrar uma forma de pagar o seu sustento e a sua moradia. E, no Brasil, as únicas profissões, para nós, é a prostituição ou em salões de beleza”, relata.

A forma de prostituição também é diferente. Os locais de trabalho de travestis, transexuais e michês são em pontos estratégicos de ruas e avenidas. “Acabamos ficando mais expostos ao perigo, principalmente a pessoas homofóbicas, mas também tenho clientes fixos e de alto padrão financeiro que preferem me encontrar em ruas com pouca iluminação para não se exporem”, conta.

*Os nomes foram trocados para preservar a imagem dos entrevistados.

 

 

Esse post foi publicado em Matéria e marcado , , , , . Guardar link permanente.

Deixe um comentário